Los Angeles, 1932
Estados Unidos respondem à crise econômica de 1929, mas presença de competidores diminui
O "crash" da Bolsa de Valores em 1929 fez o mundo duvidar do poderio econômico dos EUA, e a economia norte-americana só começou a se recuperar em 1933, com o New Deal do presidente Roosevelt. No esporte, porém, a resposta veio já em 1932, com os Jogos Olímpicos de Los Angeles.
Apesar da recente crise financeira, não faltou dinheiro para organizar os Jogos. Graças ao patrocínio de US$ 1,5 milhão da Prefeitura de Los Angeles e ao apoio da iniciativa privada, várias instalações foram construídas ou reformadas. O Estádio Olímpico, por exemplo, teve a capacidade ampliada de 70 mil para 100 mil lugares. Construiu-se, também, um estádio hípico e o campo de futebol americano da Universidade de Pasadena foi transformado em um velódromo para 85 mil espectadores.
A Vila Olímpica, inovação dos Jogos de 1924, foi construída em estilo colonial, com 700 casas pré-fabricadas erguidas sobre um campo de golfe com vista para o oceano Pacífico. Em um detalhe hollywoodiano, a segurança da Vila foi feita por vaqueiros a cavalo.
A crise, porém, foi sentida. Os elevados custos da viagem para a costa oeste dos EUA fizeram de Los Angeles-1932 a edição olímpica com a menor participação de atletas desde 1908. Apenas 1.332 esportistas competiram, menos da metade de Paris-1924 e de Amsterdã-1928.
O Brasil, o café e os profissionais
A crise financeira no Brasil também fez a diferença nos Jogos. O governo brasileiro financiou a viagem dos atletas para Los Angeles em troca de trabalho. A delegação embarcou com 50 mil sacas de café em um navio e tinha de vender a semente pelo caminho. Quem não vendesse não competiria.
Dos 69 atletas que foram para os Estados Unidos, 24 retornanram. Além dos esportistas que superaram a "eliminatória do navio", outros 13 viajaram por conta própria, completando a equipe.
Entre os 58 atletas brasileiros havia apenas uma mulher, a nadadora Maria Lenk, que se tornou a primeira atleta sul-americana a competir numa Olimpíada. Lenk participou dos 100 m livre, dos 100 m costas e dos 200 m peito, prova em que foi eliminada nas semifinais. A atleta aprendeu a nadar no rio Tietê e ficou conhecida no país por introduzir por aqui o nado borboleta.
Entre os homens, poucos se destacaram. O corredor Adalberto Cardoso, por exemplo, precisou de um esforço sobre-humano para disputar a prova dos 10.000 m. O navio brasileiro aportou em San Francisco, e Cardoso precisou ir a pé e de carona até Los Angeles. Depois de um dia, chegou ao local da prova, bastante atrasado. Cardoso juntou-se aos demais atletas quando faltavam só dez minutos para a largada. Com toda essa trapalhada, terminou a corrida em último. Sua história acabou rendendo notícias nos jornais norte-americanos. O "Los Angeles Times" apelidou o brasileiro de "O Homem de Ferro".
Nos outros países, dois grandes nomes do atletismo mundial não participaram dos Jogos: o finlandês Paavo Nurmi e o francês Jules Ladomegue. Nurmi foi proibido de participar pela Federação Internacional de Atletismo um dia antes da cerimônia de abertura, acusado de ter exigido o pagamento de um percentual sobre os ingressos vendidos nas corridas de que participava. Ladoumegues, por sua vez, foi suspenso pela federação francesa pelo mesmo motivo, mas esteve em Los Angeles como enviado especial do jornal "L'Intransigeant".
| PAÍS | OURO | PRATA | BRONZE | ||
|---|---|---|---|---|---|
| 1º |  ESTADOS UNIDOS | 41 | 32 | 30 | 103 |
| 2º |  ITÁLIA | 12 | 12 | 12 | 36 |
| 3º |  FRANÇA | 10 | 5 | 4 | 19 |
| 4º |  SUÉCIA | 9 | 5 | 9 | 23 |
| 5º |  JAPÃO | 7 | 7 | 4 | 18 |
| 6º |  HUNGRIA | 6 | 4 | 5 | 15 |
| 7º |  FINLÂNDIA | 5 | 8 | 12 | 25 |
| 8º |  REINO UNIDO | 4 | 7 | 5 | 16 |
| 9º |  ALEMANHA | 3 | 12 | 5 | 20 |
| 10º |  AUSTRÁLIA | 3 | 1 | 1 | 5 |
Mildred "Babe" Didrikson (Estados Unidos)
Considerada por muitos como a atleta mais completa da história, Mildred Ella "Babe" Didrikson Zaharias brilhou em Los Angeles-1932. Aos 21 anos, a norte-americana conquistou duas medalhas de ouro (lançamento de dardo e 80 m com barreiras) e uma de prata (salto em altura). Vencedora da seletiva nacional em cinco eventos, só não ganhou mais medalhas porque as mulheres estavam limitadas a participar de três provas na Olimpíada.
O sucesso futuro de Mildred nos esportes era óbvio desde a infância. O apelido, Babe, veio de Babe Ruth, lendário jogador de beisebol. Quando pequena, jogando beisebol contra garotos, ela não se cansava de acertar "home runs", jogando a bola para fora do campo. No basquete, mesmo baixa, foi eleita All-American, premiação dada aos melhores jogadores da nação no nível escolar, por três anos seguidos.
Ninguém se espantou, então, quando, aos 16 anos, ela se tornou recordista mundial do lançamento de dardo, com 40,66 m. Na Olimpíada de 1932, conquistou o ouro nos 80 m com barreira estabelecendo o recorde mundial (43s68). No salto em altura, Mildred foi superada pela compatriota Jean Shiley, que levou a melhor no desempate.
Lenda do golfe
Depois dessa Olimpíada, Mildred Didrikson se dedicou ao golfe e foi uma das mulheres mais importantes da modalidade. No total, somou 82 títulos na carreira, 17 deles seguidos. Ao lado de seu marido, George Zaharias, e da também golfista Patty Berg ela criou a Ladies Professional Golf Association (LPGA), até hoje a entidade mais importante do golfe feminino.
Em 1950, Babe foi eleita pela agência de notícias Associated Press como a melhor atleta da primeira metade do século 20, por suas conquistas olímpicas e no vôlei. Em 1953, ela descobriu que tinha câncer. Com tratamento, ainda conseguiu jogar até 1955, quando venceu seu último torneio. Morreu em setembro de 1956, vítima do câncer, que já tinha atingido as glândulas linfáticas.
Outros destaques
- Romeo Neri (Itália)
Conquistou três medalhas de ouro (individual geral, barras paralelas e equipes). Ao final do torneio, técnicos e críticos afirmaram que ele revolucionou o esporte, com exercícios velozes e acrobáticos inéditos.
- Carl Westergren (Suécia)
Conquistou seu terceiro título na luta greco-romana. Em 1920, foi ouro nos médios. Em 1924, nos semipesados. Em 1928, fracassou. Voltou a ganhar o ouro em 1932, dessa vez nos superpesados.
Campeã ou campeão?
A polonesa Stanislawa Walasiewicz venceu os 100 m com recorde mundial - 11s9 - recebendo o título de "mulher mais rápida do mundo". Criada nos Estados Unidos, adotou o nome de Stella Walsh e competiria pelos EUA nos Jogos se tivesse conseguido a naturalização. Não conseguiu, competiu pela Polônia e virou celebridade tanto na América, quanto em sua terra natal. Em 1980, porém, saindo de um supermercado em Cleveland, foi assassinada. A polícia fez uma autópsia e acabou surpresa: a campeã olímpica era hermafrodita.
Vinho isotônico
Apesar da "Lei Seca" que vigorava nos Estados Unidos na época dos Jogos, o governo norte-americano permitiu que as delegações de França e Itália levassem vários litros de vinho para Los Angeles. Os países alegaram que a bebida fazia parte da sua dieta alimentar.
Recorde em 2º lugar
Nos 400m com barreiras, Glenn Hardin (EUA) foi prata, mas bateu um recorde mundial. Robert Tisdale (IRL) foi ouro com melhor tempo, 51s7 contra 51s9, mas não teve o recorde homologado porque derrubou uma barreira. Pelas regras, o resultado valia, mas o recorde.
Jogos de Hollywood
Nos 400 m livre da natação, Buster Crabbe (EUA) levou o ouro. Anos mais tarde, assim como o compatriota Johnny Weissmuller, virou o Tarzan de Hollywood. Já o esgrimista Errol Flyn (AUS) saiu sem medalhas, mas também virou estrela, com As Aventuras de Robin Hood.
Você sabia?
- Japão dominou a natação (11 pódios, cinco ouros), com uma equipe com média de 15 anos. Exemplos da precocidade, Yosuki Miyazaki, 16, nos 100 m, e Kusuo Kitamura, 14, nos 1.500 m, foram ouro.
- Pela 1ª vez, árbitros mudaram o resultado de uma final ao rever imagens da chegada. O bronze nos 110 metros com barreiras, que na primeira vez favoreceu Jack Keller (EUA), foi dado a Donald Finlay (GBR).
- Campeã olímpica em 1928, a seleção de hóquei sobre a grama da Índia pediu que Mahatma Ghandi fizesse um chamado à população para contribuir com dinheiro para a viagem. Ghandi respondeu: "O que é hóquei?"
- Depois de ter conquistado a Manchúria e instalado um governo fantoche, o Japão tentou enviar uma delegação da região para participar dos Jogos. Apesar da pressão, o COI negou o pedido.
- Jornalistas do mundo todo usaram novidades tecnológicas, como um centro com linhas de telex. Jornais ou agências de notícias contavam com impressora própria para divulgar os resultados.
- Juan Zabala (ARG) venceu a maratona, mas quase não sobreviveu. Na chegada, o boxeador Carmelo Robledo, campeão olímpico, acertou um mastro de bandeira na cabeça de Zabala, que desmaiou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário